sexta-feira, 27 de maio de 2011

Palocci e o "justiçamento midiático"

Reproduzo a seguir parte do texto de Miguel do Rosário, escritor, blogueiro há mais de 10 anos, que mantém o Óleo de Diabo. O texto é longo, por isso vou deixar o link da publicação original para quem se interessar em lê-lo na íntegra (leiam!). Miguel fala com muita propriedade e serenidade sobre o amplamente discutido caso de enriquecimento do Ministro-Chefe da Casa Civil, Antônio Palocci.
Ele não faz o papel de advogado de ninguém. Isso fica claro no texto. Mas atenta para uma prática comum na mídia, o de julgar. E nos leva a refletir e observar com mais atenção alguns fatos e fatores. Como o da importância de Palocci para o desenvolvimento do Brasil na era Lula, quando então Ministro da Fazenda. Como a fonte de todo esse "escândalo", pois a Folha de São Paulo fez a "denuncia" com base em dados da receita federal, ou seja, em dados legais. 
Quando um político influente, bem informado, bem posicionado, deixa seu cargo e se faz valer do bom transito que tem nos bastidores, dos bons contatos, da excelente percepção de cenário, e dessa forma ganha alguns milhões dando consultoria a empresas dispostas a pagar esses milhões e faturarem outros milhões e até bilhões. Quando esse cara faz isso numa sociedade de um capitalismo feroz e aparentemente faz de forma lícita, qual o seu crime?
Melhor escreve Miguel do Rosário:


O caso Palocci: ingenuidade, oportunismo e manipulação
Atacar Palocci seria uma excelente oportunidade para este blogueiro demonstrar sua independência em relação ao governo Dilma. Afinal, de fato, ser blogueiro (blogueiro político, para ser mais exato) tornou-se uma espécie de cargo militar na guerra midiática em curso no Brasil desde a assunção da esquerda ao poder, em 2003. A gente vê os erros em nosso próprio campo, mas a prioridade é defender o nosso lado e atacar o adversário. Não é uma filosofia muito bonita, do ponto-de-vista da ética jornalística, mas é a realidade concreta, como diria Lênin. E os jornais, na verdade, são apenas mais hipócritas, quando negam ter igualmente uma postura orgânica em defesa de uma ideologia e dos partidos políticos que a professam. A gente nunca está totalmente à vontade nessa guerra, todavia, e sonhamos em abandonar a farda e nos tornarmos verdadeiramente imparciais. E aí que se dane Palocci e Dilma. Eles que se virem. Eu sou um blogueiro livre!
A derrota da mídia, neste sentido, nunca é completa, porque seus candidatos podem perder as eleições, mas os periódicos continuam a circular normalmente, e a audiência do Jornal Nacional permanece estável. Além do mais, os vitoriosos, para vencerem, tiveram que assumir alguns valores do adversário, mesmo que disso não tenham consciência.
De qualquer forma, essa é a democracia que temos, e não é correto sermos maniqueístas ou dramáticos. Nem o nosso campo político é composto de santos, nem nossos adversários são demônios ansiosos para destruir o Brasil. Passado o processo eleitoral, temos que buscar a paz; não sou eu que digo; é o que consta no preâmbulo da nossa Constituição:
Nós, representantes do povo brasileiros, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado democrático, (….) uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias(…).
Enfim, eu poderia atacar Palocci, e mostrar como eu sou independente. No entanto, não o farei pelos seguintes motivos:
Não sou juiz nem policial. Não gosto desse papel. Não o faço nem com quadros políticos que eu combato. Quem pode definir se fulano cometeu crime ou não é a Justiça, e quem tem a função de investigá-los é a polícia ou o Ministério Público. Poderia citar aqui o “jornalista investigativo”, mas essa é uma atividade que tem sido tão vilipendiada por elementos desonestos e parciais que prefiro deixá-la de fora.
Não concordo com a demonização política de Palocci, pintado como um quadro inútil e incompetente. É injusto atribuir o conservadorismo dos primeiros anos do governo Lula apenas à Palocci. Ele soube, sim, corajosamente, assumir o ônus de tudo, para preservar o presidente e o governo, mas Palocci não fez mais do que seguir as diretrizes traçadas por Lula, e Lula, por sua vez, seguiu as diretrizes traçadas pela necessidade e pelas condições políticas e econômicas do momento. Desde então, parte da esquerda estigmatizou Palocci. Todavia, por mais incômodo que seja para a esquerda aceitar, os desdobramentos da história provaram que sua política econômica estava certa. Ele mesclou conservadorismo econômico e ativismo social. Quem pagou a dívida externa com o FMI não foi Guido Mantega; foi Palocci. Quando chegou a crise política, e o governo foi posto no pelourinho da mídia, seus defensores estavam armados com as estatísticas que a gestão Palocci lhes forneceu. Inflação baixa, forte crescimento econômico, acelerado processo de distribuição de renda em marcha, dívida externa paga.
Palocci assumiu todos os ônus, junto à esquerda, pelas políticas conservadoras, deixando que Lula figurasse como um deus olímpico, livre de qualquer peso simbólico das decisões difíceis. Tanto que hoje, os que defendem a queda de Palocci alegam que Dilma deve se realinhar ao “lulismo” para poder governar. Ora, Palocci não foi “lulismo”? Na verdade, o Palocci de hoje é um articulador político, sem nenhuma influência sobre a política econômica, enquanto na gestão anterior era o titular do Ministério da Fazenda!
[...]
Eu acho que o governo Dilma tem força suficiente para aguentar o tranco de uma eventual queda de Palocci. Se houver algo de concreto, ele terá de sair. Não boto a mão no fogo por Palocci assim como não fiz com nenhuma figura do governo Lula.
Quanto às denúncias de enriquecimento, mais uma vez apelo à Justiça. Não vou condenar Palocci simplesmente por ganhar dinheiro. Arminio Fraga comprou o MacDonalds América Latina por 1,5 bilhão de dólares logo após sair do governo FHC. André Lara Resende, de pobre ficou miliardário, com haras até na Inglaterra. Palocci comprou um apartamento de 6 milhões de reais.
Não digo isso para repetir o discurso de que "se eles fazem, nós também podemos fazer", mas para mostrar que o mercado costuma receber ex-integrantes de equipe econômica com muita generosidade. Alguns dizem que a lei é falha, ou que a quarentena imposta é pequena. Não sei. Nesse ponto, prefiro o ceticismo. Se a quarentena fosse excessiva, ou se proibíssemos que ex-membros da equipe econômica ganhassem dinheiro em consultorias, abertamente, declarando ao fisco, estaríamos estimulando que o sujeito ganhasse dinheiro por baixo dos panos. É a lei da oferta e da procura.

Texto na íntegra AQUI, no blog Óleo do Diabo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário