quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

A direita gaúcha sem disfarces: “quilombolas, índios, gays e lésbicas são tudo que não presta”

Texto publicado 12 de fevereiro na coluna de Marco Weissheimar no Jornal Sul21

O deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) pode se sentir em casa ao visitar seu partido no Rio Grande do Sul. Sua visão de mundo tem entusiasmados parceiros aqui nos Pampas. Sem nenhum tipo de constrangimento. Pelo contrário. Bolsonaro quer presidir a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados. Seu colega gaúcho ilustra sem disfarces o que seria essa comissão sob o comando dessa visão.

“Quando o governo diz: ‘nós queremos crescimento, desenvolvimento. Tem de ter fumo, tem de ter soja, tem de ter boi, tem de ter leite, tem de ter tudo, produção’. Ok! Financiamento. Estão cumprimentando os produtores: R$ 150 bilhões de financiamento. Agora, eu quero dizer para vocês: o mesmo governo, seu Gilberto Carvalho, também é ministro da presidenta Dilma. É ali que estão aninhados quilombolas, índios, gays, lésbicas. Tudo o que não presta ali está aninhado. E eles têm a direção e o comando do governo”. As declarações foram feitas pelo deputado federal do PP gaúcho, Luiz Carlos Heinze, presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, durante uma audiência pública com produtores rurais em Vicente Dutra (RS), no dia 29 de novembro de 2013. O vídeo com o discurso de Heinze foi publicado no blog da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (ver abaixo).


Além de dizer que índios, gays, lésbicas e quilombolas são “tudo que não presta”, o deputado do PP sugeriu aos agricultores presentes na audiência pública que contratassem seguranças armados privados para resolver seus “problemas com os índios”. Ele citou o caso do Pará como exemplo a ser seguido:

“O que estão fazendo os produtores do Pará? No Pará, eles contrataram segurança privada. Ninguém invade no Pará, porque a brigada militar não lhes dá guarida lá e eles têm de fazer a defesa das suas propriedades”, diz o parlamentar. “Por isso, pessoal, só tem um jeito: se defendam. Façam a defesa como o Pará está fazendo. Façam a defesa como o Mato Grosso do Sul está fazendo. Os índios invadiram uma propriedade. Foram corridos da propriedade. Isso aconteceu lá”.

Promovida por outro integrante da bancada ruralista, o deputado federal Vilson Covatti, também do PP gaúcho, a audiência pública teve como tema o conflito dos produtores rurais da região com os indígenas do povo Kaingang, que vivem na Terra Indígena Rio dos Índios, de 715 hectares.

Heinze contou com o apoio entusiasmado do deputado Alceu Moreira, do PMDB gaúcho, que também atacou o secretário geral da Presidência da República, chamando-o de “chefe dessa vigarice orquestrada”:

“Por que será que de uma hora pra outra tem que demarcar terras de índios e de quilombolas? O chefe dessa vigarice orquestrada está na antessala da presidência da República e o nome dele é Gilberto Carvalho. Por trás dessa baderna, dessa vigarice, está o Cimi, uma organização cristã, que de cristã não tem nada. Está a serviço da inteligência norteamericana e europeia para não permitir a expansão das fronteiras agrícolas no Brasil”.

Alceu Moreira diz que os parlamentares não vão incitar a guerra e, logo em seguida, passa a incitar a guerra:

“Nós, os parlamentares, não vamos incitar a guerra, mas lhes digo: se fartem de guerreiros e não deixem um vigarista desses dar um passo na sua propriedade. Nenhum! Nenhum! Usem todo o tipo de rede. Todo mundo tem telefone. Liguem um para o outro imediatamente. Reúnam verdadeiras multidões e expulsem do jeito que for necessário. A própria baderna, a desordem, a guerra é melhor do que a injustiça”.

Luiz Carlos Heinze e Alceu Moreira poderiam pertencer ao mesmo partido. Não é assim por contingências da política. Mas, na verdade, pertencem a uma mesma bancada, uma das maiores do país, a bancada ruralista, um partido informal com muito poder, preconceito e autoritarismo. Vem do berço político. O DNA golpista e autoritário da antiga Arena aparece em todo seu esplendor nas manifestações dos deputados em Vicente Dutra.

Essa ideologia truculenta terá como candidata ao governo do Estado no Rio Grande do Sul, a senadora Ana Amélia Lemos que, se por um lado, não adota esse discurso odioso publicamente, por outro tampouco o condena. A julgar pelas manifestações acima, no dia em que o PP e seus aliados governarem o Rio Grande do Sul, índios, gays, lésbicas, quilombolas e outras categorias dos que não prestam terão que se mudar de Estado. Neste dia, só ficarão morando no “Rio Grande” os homens de bem e os que prestam, aqueles que querem “expandir a fronteira agrícola” e não deixar “nenhum vigarista entrar em suas terras”. E há quem ache que o fascismo é algo distante de nós.

Quando ainda estava na Assembleia Legislativa, Flavio Koutzii escreveu um artigo intitulado “A extrema-direita brasileira mora nos Pampas”. O vídeo acima fornece uma didática ilustração disso.

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